domingo, 26 de outubro de 2008

…Ensaio sobre a liberdade…





Um dia sonhei ser como tu. Sonhei que eras o meu Deus. Deus das lacunas. Prescrevias o meu comportamento com a tua falsa e exemplar presença. Palavras. Nem me fales em palavras. Não passam de espinhos pontiagudos escondidos por detrás de ilusórias boas intenções. Um dia sonhei-te real. Nunca foste. Mas tentei, ho se tentei!
Confundo tudo o que és. A tua essência soou-me verdadeira. Era fugaz e suja. Já para não falar do teu olhar enganador. Saiu-te ao lado. Não perdoei. Estou melhor agora. Chorei um pequeno regato, mas lembrei-me que sou filho pródigo da vida. Sei mais do que tu. Hoje estou a sentir com todo o meu coração, achei a verdade. Preparaste mil e uma armadilhas. Fui prodígio ao fugir de todas elas. Já não és o meu encosto. Aprecio todos os prazeres da vida. Este jardim dá-me vontade de to provar. O cheiro a lavanda invade-me o olfacto docemente, acaricia-me. Estou prostrado a este brilho que me norteia. Encontro o meu caminho. O meu encosto é este banco do jardim. As pessoas, que passam deambulando sobre as vibrações sonoras dos carros percorrendo as ruas citadinas, mostram-se vivas. È deveras surreal. O sol brilha sob a massa branca e flutuante, animadora até, das nuvens viajantes. Elas trazem verdade de além-mar, já viram as maiores maravilhas do mundo. Olho para cima em busca do verdadeiro Deus. Fecho os olhos. Já não me deixo enganar. Encontrei o meu Alfa e caminho para o Ómega. Tudo tem um princípio, fim, e tempo determinado. Aqui não sou crédulo como me fizeste crer que era. Já sei a diferença entre História e estória. Sinto-me de tal maneira grande que sou capaz de jurar que alguém no espaço me conseguiria ver cá em baixo, maior que a muralha da china, mais alto que o evereste, o meu interior dança como “chiva”, criando os céus e a terra, sábio como “Buda”, secretamente divino. Por falar em segredos. Conto-te um. Fui divino. Tudo te dei, Tudo te tirei.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Intemporal


Cu-cu cu-cu…ao som do cuco e das sete badaladas que marcavam o findar da manhã ali estava eu. A sala de estar estava numa temperatura aprazível, aquecida pela lareira de estilo simplista, e eu sentado no meu cadeirão, ainda de pijama e com um robe para me aconchegar do vento que assobiava lá fora como uma surdina. Passava um homem que, trivialmente, passeava o seu adorado cão, tão velho como o dono, no pequeno e requintado jardim público que cerca a urbe de casas. Louco seria ele, mas mais louco estava eu. O velho deambulava sobriamente quase controlado pelo seu estimado animal, sobre uma chuva ligeira, uma chuva extemporânea, daquelas dignas de um romance. Uma caricatura interessante. Sem sentido. O mundo pareceu-me apenas um pouco mais vazio.
Já não sou Rei da minha pessoa. Estou distante. Esperançado, mas distante. Fantoche deste mundo. Ai, mundo! A realidade é perversa. Deixa-me. Estou bem. Tudo aqui parece sereno, transparente, elevado. Puro. Transcende-me. Estou entre o céu e a terra. Flutuo sobre a neblina flutuante com o espírito livre, emergindo da massa dos homens para tocar Deus. A eternidade num segundo. O efêmero estendido no infinito. O principio do Omega e o fim do Alfa, o Universo num sopro fugaz, suave e saboroso.
Tenho a impressão de que a vida tem um sentido místico onde mil um mistérios por desvender estão camuflados, resguardados, protegidos (será?), para lá do visível, enigmas sumptuosamente escavados em rochas de amor que são palavras em letra antiga, herméticos, velhos sons que não se ouvem mas pressentem-se. Segredo do mundo, o Mundo num segredo.

sábado, 4 de outubro de 2008

Solsticio divino


O vento assobiava suavemente por entre o vazio mudo do Mundo. Cego, surdo e mudo, diria eu. Aquele eucaliptal, que com todo o obséquio presenteava a atmosfera de um odor a menta, juraria eu, divinal.
Era este o caminho que percorria apressadamente, a horas matutinas, frequentemente, só para te ver. Nunca admiti mas era por isso.
Corro atrás do prejuízo, em vão, mas continuo incessantemente em busca do perdão que jamais terei. Sei bem disso. Por detrás de folhas estranhamente verdes na manhã outonal, com o meu código civil abraçado junto ao peito, lá te vejo eu mais uma vez.
É estranho. Estou a 15 metros de ti mas sou capaz de sentir o teu perfume. E o teu cabelo? Ai, o teu cabelo. Um dourado semelhante á areia reluzindo o sol, que, tão bem te fica contrastando com os olhos cor de avelã.
Num momento de loucura sinto os meus pés a querer avançar até ti. Que insanidade. Jamais me quererias ver. O teu sorriso está apagado á meses. Destruí o que mais gostava em ti, o que mais me aconchegava.
Corro no sentido contrário ao teu para evitar o inevitável. O sol aparecia agora por detrás das montanhas. O céu estava limpo. A minha vida um impasse.
O tecido persa ao qual chamo Vida está roto, está estragado, não foi bem tecido nem fiado, ganhou, repentinamente, semelhanças com um vaso muçulmano com toda a sua fragilidade, um tecido indiano com toda a sua pobreza de cor, uma esfinge sem adivinhas nem aventuras, uma pirâmide com um só caminho, uma bíblia em branco, uma montanha sem Maomé, um quotidiano sem conceito.
Nada é certo, mas tu ainda és menos, és a borboleta do meu jardim rosário a qual nunca apanharei. A mais bela. Ninfa num jardim de Ódin, nascida das pétalas de uma rosa branca.
Fiz uma descoberta. O que me prende neste mundo é apenas a gravidade, mas já nem isso me agarra aqui. Se soubesses que o vazio dentro de nós pode ser maior que a própria vida…não sabes, nem sonhas. Neste momento não passo de algo a descobrir por um Newton, ou Einstein qualquer. Sou teoria de relatividade, sou constitucionalmente consuetudinário, sigo-me por leis que não existem mas que são palavra da razão. Tu és imperial, a tua indiferença é bárbara, eu sou muralha da china feita em pó.